“Eu vou para os Açores amanhã, não posso adiar mais a passagem, vou lá ficar uns dias sozinho. Tenho uma casinha nas Flores, onde a minha mãe nasceu. Gostava que fosses lá ter comigo. É só dizeres o dia e eu marco a passagem.”
!?! Estou a tentar não parecer impressionada. “Lamento, mas como te disse, para a semana vou para a Amazónia, tenho viagem marcada, ainda tenho montes de coisas para tratar e tenho de ir com a equipa, temos montes de equipamento para levar e…”
Ela ficou mesmo speechless. Depois desenvolveu um chorrilho de desculpas. “Vá lá, ainda por cima fica a caminho. Podes pelo menos tentar alterar a passagem, apanhar um voo para os States ou para o Canadá e daí vais para onde quiseres. Ainda chegas primeiro que os teus colegas, se for preciso. Um dia, não te peço mais que isso.”
“Um dia para quê? Não penses que me compras com uma viagem aos Açores, eu não sou nenhuma puta, tá bem?”
Ela quando quer sabe ser dura. Mas eu não estava disposto a desistir tão facilmente. “Muito pelo contrário, a ideia é eu ser o teu escravo sexual, deixa-me provar-te que não preciso de usar o meu «pau» para te enlouquecer de prazer.”
Tou a beber, e engasgo-me. Não são conversas para se ter à mesa, não consigo comer nada. Será impressão minha ou isto saiu de um filme qualquer? É demasiado irreal. “Como é que eu posso confiar em ti? Eu não te conheço! Como é que eu sei que não chego lá e no meio do nada tu decides violar-me? Como é que eu sei que tu não és um serial killer?”
“Olha para mim. Olha-me nos olhos e diz-me se vês um violador ou um serial killer.”
Eu sempre tive péssimo sentido para avaliar o carácter das pessoas à primeira impressão. Geralmente quando embirro com alguém, é porque é boa pessoa. Aconteceu com a Catarina, a primeira vez que a vi achei-a super convencida, insuportável.
“Tens de confiar em mim, eu jamais faria alguma coisa que não quisesses. Fala com a Alice, ela conhece-me bem. Pensa nisso.” E decidi não insistir mais. Percebi que era tudo uma questão de tempo, de a deixar pensar sobre o assunto. As cartas estavam na mesa, era a vez dela decidir se queria jogar ou não.
Pois, mas eu também não conheço a Alice assim tão bem…
“É estranho para mim essa vossa relação, tão… aberta. Vocês não têm ciúmes?”
Tenho ciúmes do tempo que ela passa com a agente, com os músicos, com os fãs… não tenho ciúmes dos encontros sexuais dela com outras pessoas. É estranho isso? Talvez. Nós baseamos a nossa relação na sinceridade, procuramos ser sempre honestos um com o
outro. Não ia gostar que ela fosse para a cama com alguém e não me contasse, isso sim, seria uma traição.
“Mas agirias assim com alguém que amasses?”
“Eu amo a Alice. Lá por não querer passar o resto da minha vida com ela não significa que não goste a sério dela. Eu não acredito na monogamia, o ser humano não foi feito para conhecer apenas um parceiro sexual e passar o resto da vida com ele, nós gostamos de variedade e evoluímos com isso. O problema está em saber gerir os sentimentos e as relações com honestidade. Podes dar maior prova de amor a alguém do que aceitar que essa pessoa escolha com quem quer estar? Não é puro egoísmo quereres a pessoa que amas só para ti? A fidelidade não pode ser um conceito a que se fica preso, cheio de medo de cair em tentação. Fidelidade tem de ser um sentimento recíproco de honestidade e compreensão. Honestidade para assumir o que se quer e o que se pensa e compreensão para entender o que os outros querem e pensam.”
É um ponto de vista. Até parece fazer sentido, mas eu não sei. Este jantar está a deixar-me confusa, ele exerce uma influência estranha sobre mim que eu não consigo controlar, tenho um bocado de medo disso.
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