Quando os admiradores da Sra. Tatcher afirmavam que ela “tinha tomates”, não queriam dizer certamente que a dama de ferro era um travesti, mas antes que tinha “carácter”. “Pulso”. Por outras palavras, os testículos eram erguidos à categoria de símbolo. (...)
Contudo, esta relação entre coragem e testículos não é evidente a priori. Talvez os homens tenham reparado que, em situação de fraqueza devida ao frio ou ao medo, os testículos encolhem e se recolhem no corpo, a ponto de ser muito difícil castrar coelhos, porque os seus testículos desaparecem quando se tenta agarrá-los.
É verdade que a castração é conhecida desde a Antiguidade. Não sei quem foi o primeiro que teve a ideia de cortar os tomates de um touro ou de um homem. É possível que a descoberta tenha ocorrido por acaso, na sequência de um acidente que teria castrado a vitima. Seja como for, descobriu-se que um animal sem testículos era mais dócil, desenvolvia mais gordura e interessava-se menos pelo deboche, o que era prático, tanto para os animais de quinta como para os guardas de haréns.
Como é evidente, a endocrinologia não era conhecida. Serão necessários muitos séculos até a biologia demonstrar que os testículos produzem uma hormona masculina, a testosterona. Esta hormona actua sobre o corpo, contribuindo para produzir músculo, mas também sobre o cérebro e o pénis, por intermédio da sua acção na libido e na erecção. Estes efeitos são visíveis nos homens submetidos a castração por razões médicas: a libido diminui bruscamente devido à quebra da testosterona. Não obstante, este facto não permite deduzir a existência de uma relação simples entre a testosterona e a sexualidade.
É conhecido, por exemplo, o efeito de retroalimentação no circuito da testosterona: a testosterona aumenta a actividade sexual, mas também aumenta graças a esta última (os homens segregam mais testosterona enquanto vêem um filme porno). É por isso que é difícil dizer se os engatatões vão para a cama mais vezes porque têm mais testosterona, ou se têm mais testosterona porque vão para a cama mais vezes.
Além disso, a testosterona não é uma espécie de afrodisíaco que se possa ingurgitar em injecções ou em cápsulas para melhorar o desempenho. É necessário um mínimo para se ter uma libido honesta, mas esta não aumenta linearmente com a testosterona. Ao invés, a castração não suprime forçosamente toda a vida sexual. Por exemplo, se um animal já tinha copulado antes de ser operado, pode continuar a fazê-lo depois (sem testosteona, a erecção será menos fácil, mas não é totalmente impossível).
Regressemos, porém, a essa famosa força de carácter, pois é dela que se trata quando se utiliza a expressão “ter tomates”. A observação de animais sugere que há alguma verdade nisso. Sabe-se que, nos grupos de primatas, os machos dominantes segregam muitas vezes mais testosterona. Mas é difícil dizer que se possuem mais por serem dominantes, ou se são dominantes porque possuem mais. Na verdade, é por intermédio da sexualidade que a hormona actua. O mais bem dotado em testosterona não é forçosamente o macho dominante, mas é o mais activo no plano sexual. Embora um macho dominante posa ter mais hipóteses de segregar testosterona porque tem mais fêmeas à sua disposição, as fêmeas podem preferir um subalterno e, nesse caso, ainda que ele continue a ser dominante, a sua testosterona diminui.
Nos seres humanos, é ainda mais difícil relacionar hormonas e comportamento. Algumas investigações mostram que a testosterona induz uma certa forma de agressividade: aumentaria, por exemplo, imediatamente antes de uma competição desportiva. Mas não se deve perspectivar esse tipo de relação sem se ter em consideração factores sociais e culturais. E aí, as hormonas tornam-se secundárias. Por exemplo, os delinquentes, mesmo os sexuais, não segregam mais testosterona que qualquer outra pessoa, e daí a ineficácia de uma castração terapêutica. Os suíços castraram cerca de 10 000 delinquentes no século XX, e, tanto nos Estados Unidos como em certos países da Europa do norte, recorre-se amplamente à castração química de criminosos sexuais, apesar de a supressão da testosterona nunca ter abolido as pulsões que lhes são imputadas.
Portanto, se fizermos um balanço, quando dizemos que um indivíduo “tem tomates” referindo-se ao seu carácter, cometemos pelo menos três erros. O primeiro consiste em fazer da coragem uma característia relacionada com a testosterona. É verdade que esta aumenta a libido e, talvez, em certa medida, a agressividade, mas nada tem que ver com o carácter. Um indivíduo pode ser corajoso sem ser megalómano ou maníaco do sexo, e, inversamente, o cobarde agressivo e libidinoso é uma realidade.
Mesmo que a testosterona aumentasse a coragem, o segundo erro esta em transformá-lo numa característica exclusivamente masculina. Com efeito, as mulheres também produzem testosterona nos seus ovários – em menor quantidade que os homens nos seus testículos, mas produzem. Na mulher, de resto, é a subida da testosterona que aumenta o desejo quando a ovulação se aproxima.
E, em terceiro lugar, o poder da testosterona deve ser relativizado. Como demonstram algumas investigações, a testosterona, para actuar, transforma-se, em certas situações, numa hormona feminina – o estradiol. Esta transformação faz-se por intermédio de uma enzima chamada aromatase, presente no cérebro e também nas gorduras. Em suma, a hormona masculina transforma-se em hormona feminina para actuar! E o pior é o que se passa nos testículos: as células de Sertoli, que alimentam os espermatozóides no fundo dos testículos, funcionam apenas graças a estrogénios. Estão a ouvir, machões? Nas profundezas dos vossos tomates, quem se esfalfa a trabalhar são as hormonas femininas!
Acabámos de apresentar boas razões para repor no seu devido lugar o velho mito que situa as virtudes masculinas nos penduricalhos. Homens e mulheres possuem hormonas masculinas e femininas simultaneamente, e é tempo de acabar com esse mito de uma dualidade psicológica baseada nas hormonas. O mito gerou muitos absurdos, como o de alimentar a ideia de uma “força de carácter” instalada nos testículos. Apesar da sua popularidade, a expressão “ter tomates” é machista e infundada.
É verdade que a castração é conhecida desde a Antiguidade. Não sei quem foi o primeiro que teve a ideia de cortar os tomates de um touro ou de um homem. É possível que a descoberta tenha ocorrido por acaso, na sequência de um acidente que teria castrado a vitima. Seja como for, descobriu-se que um animal sem testículos era mais dócil, desenvolvia mais gordura e interessava-se menos pelo deboche, o que era prático, tanto para os animais de quinta como para os guardas de haréns.
Como é evidente, a endocrinologia não era conhecida. Serão necessários muitos séculos até a biologia demonstrar que os testículos produzem uma hormona masculina, a testosterona. Esta hormona actua sobre o corpo, contribuindo para produzir músculo, mas também sobre o cérebro e o pénis, por intermédio da sua acção na libido e na erecção. Estes efeitos são visíveis nos homens submetidos a castração por razões médicas: a libido diminui bruscamente devido à quebra da testosterona. Não obstante, este facto não permite deduzir a existência de uma relação simples entre a testosterona e a sexualidade.
É conhecido, por exemplo, o efeito de retroalimentação no circuito da testosterona: a testosterona aumenta a actividade sexual, mas também aumenta graças a esta última (os homens segregam mais testosterona enquanto vêem um filme porno). É por isso que é difícil dizer se os engatatões vão para a cama mais vezes porque têm mais testosterona, ou se têm mais testosterona porque vão para a cama mais vezes.
Além disso, a testosterona não é uma espécie de afrodisíaco que se possa ingurgitar em injecções ou em cápsulas para melhorar o desempenho. É necessário um mínimo para se ter uma libido honesta, mas esta não aumenta linearmente com a testosterona. Ao invés, a castração não suprime forçosamente toda a vida sexual. Por exemplo, se um animal já tinha copulado antes de ser operado, pode continuar a fazê-lo depois (sem testosteona, a erecção será menos fácil, mas não é totalmente impossível).
Regressemos, porém, a essa famosa força de carácter, pois é dela que se trata quando se utiliza a expressão “ter tomates”. A observação de animais sugere que há alguma verdade nisso. Sabe-se que, nos grupos de primatas, os machos dominantes segregam muitas vezes mais testosterona. Mas é difícil dizer que se possuem mais por serem dominantes, ou se são dominantes porque possuem mais. Na verdade, é por intermédio da sexualidade que a hormona actua. O mais bem dotado em testosterona não é forçosamente o macho dominante, mas é o mais activo no plano sexual. Embora um macho dominante posa ter mais hipóteses de segregar testosterona porque tem mais fêmeas à sua disposição, as fêmeas podem preferir um subalterno e, nesse caso, ainda que ele continue a ser dominante, a sua testosterona diminui.
Nos seres humanos, é ainda mais difícil relacionar hormonas e comportamento. Algumas investigações mostram que a testosterona induz uma certa forma de agressividade: aumentaria, por exemplo, imediatamente antes de uma competição desportiva. Mas não se deve perspectivar esse tipo de relação sem se ter em consideração factores sociais e culturais. E aí, as hormonas tornam-se secundárias. Por exemplo, os delinquentes, mesmo os sexuais, não segregam mais testosterona que qualquer outra pessoa, e daí a ineficácia de uma castração terapêutica. Os suíços castraram cerca de 10 000 delinquentes no século XX, e, tanto nos Estados Unidos como em certos países da Europa do norte, recorre-se amplamente à castração química de criminosos sexuais, apesar de a supressão da testosterona nunca ter abolido as pulsões que lhes são imputadas.
Portanto, se fizermos um balanço, quando dizemos que um indivíduo “tem tomates” referindo-se ao seu carácter, cometemos pelo menos três erros. O primeiro consiste em fazer da coragem uma característia relacionada com a testosterona. É verdade que esta aumenta a libido e, talvez, em certa medida, a agressividade, mas nada tem que ver com o carácter. Um indivíduo pode ser corajoso sem ser megalómano ou maníaco do sexo, e, inversamente, o cobarde agressivo e libidinoso é uma realidade.
Mesmo que a testosterona aumentasse a coragem, o segundo erro esta em transformá-lo numa característica exclusivamente masculina. Com efeito, as mulheres também produzem testosterona nos seus ovários – em menor quantidade que os homens nos seus testículos, mas produzem. Na mulher, de resto, é a subida da testosterona que aumenta o desejo quando a ovulação se aproxima.
E, em terceiro lugar, o poder da testosterona deve ser relativizado. Como demonstram algumas investigações, a testosterona, para actuar, transforma-se, em certas situações, numa hormona feminina – o estradiol. Esta transformação faz-se por intermédio de uma enzima chamada aromatase, presente no cérebro e também nas gorduras. Em suma, a hormona masculina transforma-se em hormona feminina para actuar! E o pior é o que se passa nos testículos: as células de Sertoli, que alimentam os espermatozóides no fundo dos testículos, funcionam apenas graças a estrogénios. Estão a ouvir, machões? Nas profundezas dos vossos tomates, quem se esfalfa a trabalhar são as hormonas femininas!
Acabámos de apresentar boas razões para repor no seu devido lugar o velho mito que situa as virtudes masculinas nos penduricalhos. Homens e mulheres possuem hormonas masculinas e femininas simultaneamente, e é tempo de acabar com esse mito de uma dualidade psicológica baseada nas hormonas. O mito gerou muitos absurdos, como o de alimentar a ideia de uma “força de carácter” instalada nos testículos. Apesar da sua popularidade, a expressão “ter tomates” é machista e infundada.
FISCHETTI, António: A Angústia do Chato antes do Coito – 36 perguntas sobre sexo que nunca fez a si próprio; Ed. Bizâncio, 1ª edição, Out. 2003.
Outras questões já abordadas aqui no âmbito deste livro:
Para que serve o adultério?
Por que é que o riso conquista as mulheres?
Outras questões já abordadas aqui no âmbito deste livro:
Para que serve o adultério?
Por que é que o riso conquista as mulheres?
12 comentários:
Há dias em que nem "tomates" tenho para ripostar, outros tenho-os e respondo na letra...enfim nada como ser mulher ;)))
Beijos prometidos
Belo post! para além de giro, muito informativo.
:)
Eu também tenho este livro. E realmente responde a questões interessantes.
Adorei o cartoon!!! Que charme!!! :)
Fiquei curiosa em relação ao livro...
Muito bom o post,bem informativo e
interessante,o cartoon ficou muito legal.
bjs.
Algo que já sabia mas que me deu um enorme prazer ao ler aqui e de uma forma tão sucinta. Parabéns!
NM
Ainda fiquei a pensar sobre os efeitos do excesso de testosterona e naquela frase "é dos carecas que elas gostam mais"...
mas para quem achou piada ao livro, coloquei os links das outras passagens já citadas anteriormente no post, e faço intenções de transcrever mais.
concordo plenamente... o valor de um homem e de uma mulher está em seu caráter, postura e atitudes... nada tem a ver com seus hormônios ou desejos sexuais!
castração é uma maldade, embora necessária em certos animais... nos estupradores, por exemplo! rsrsrs
bjão da fê =D
Seja como for... é preciso tomates para escrever um texto assim !
:))
Genial... A ciência nunca é tudo, mas a verdade é que desmistifica muita coisa... :)
E agora, quem é o macho? :)
Beijo de mulher ;)
Bom post sim. De qualquer modo, retirava metade da minha libido se tivesse a oportunidade :)
pekenina, todos nós temos um pouco de fêmea e um pouco de macho, geralmente em partes desproporcionadas.
Muito Complexo, experimenta castrar um testículo, creio que resolverá o teu problema ;)
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